Não sei se numa noite chuvosa ou numa tarde de verão. Talvez em nenhum dos dois. Mas foi num momento assim, momento de bobeira, que painho e mainha aproveitaram para fazer valer o bíblico "crescei e multiplicai-vos". Daí nove meses depois, tempo suficiente para que uma única célula gere outras trilhões, nós, meros mortais, somos então forçados a entrar de vez no mundo da luminosidade, do frio e da respiração pulmonar. De todas, essa seja talvez a mudança mais drástica pela qual passamos. É uma mudança de habitat, inclusive. A única. É como se fôssemos peixinhos boiando num saco d'água e alguém deixasse o saco cair no chão. E, até onde eu lembre, essa é a primeira vez que pulamos pra fora do ninho.
O tempo passa mais um pouquinho e, atendendo a uma demanda mundialmente aceita, temos que ser educados. Temos que viver de acordo com certas normas impostas por alguém que veio antes de nós. Temos que saber matemática, história nossa e dos outros, ciências e um catatal de coisas que, segundo papai e mamãe, vai nos fazer "alguém" na vida. E aí nos jogam em um local chamado escola para que lá possamos, no espaço de alguns anos, aprender tudo que a humanidade levou toda a sua existência para construir. É aí que pulamos do ninho de novo. Pulamos, sim, porque no ninho é bom que sempre tem comida quentinha, um local aconchegante para dormir e o conforto da asa de mainha pra nos acalentar. E na escola num tem nada disso. Ninguém - ou quase ninguém - tentar comer nosso fígado quando estamos no ninho. Mas aí você, por vezes, ter que sair do ninho. Se não, empurram-te. E se você não souber como sair do ninho, vai se esborrachar lá embaixo. Ou, caso não se espatife por completo, ainda corre o risco de ser devorado pelos seres que vivem fora do ninho.
E é por isso que nós, seres humanos, temos sorte. E temos que agradecer por ela todos os dias. Algumas espécies de águia fazem ninhos tão alto nas montanhas que se os filhotes não aprenderem a voar no espaço de uma primavera com certeza se esborracharão bonito lá embaixo. Pior ainda são as garças: seus ninhos são contruídos em galhos que passam por sobre o leito de rios infestados de crocodilos famintos. Se o filhote pular do ninho e não souber fazê-lo, e se ele não morrer da queda ou afogado, talvez seja devorado por um crocodilozinho de seis ou sete metros. Isso, sim, é crueldade, não?! Malditas garças.
Mas voltando lá pra escola, vemos que o mundo é cheio de quedas altas e crocodilos famintos. Chegamos no colégio sem conhecer ninguém e morremos de chorar quando mamãe e sua asa acalentadora vão embora. É... estamos realmente fora do danado do ninho. Mas aí vamos crescendo. Chegamos a conhecer várias pessoas alí na mesma situação que nós e começa uma ajuda mútua. Porque elas estão fora dos ninhos delas e nós, do nosso. Aí esses a gente chama logo de amigo. E o tempo vai passando. Concluímos "escola" e passamos para o próximo nível: "faculdade". Essa é outra pulada do ninho que merece destaque. Começamos a ver que aquele negócio de ir pra escola pra ser alguém na vida tinha algum fundamento, muito embora já no primeiro dia de faculdade nos mandem esquecer tudo que a gente aprendeu no colégio. E mais quatro ou cinco anos se passam para a gente concluir o estágio "faculdade". Aqui num precisa nem se preocupar em pular; caso você não o faça, eles te empurram pra fora do ninho sem piedade, tal qual as garças.
E depois da faculdade vem um outro estágio, bem mais duradouro e interessante, chamado "o resto da sua vida". Aqui vão querer comer seu fígado, pisar em você, fazer você de presa, ludibriá-lo, enganá-lo, imbecilizá-lo, aliená-lo, emburrecê-lo e por aí afora vai. Você, por vezes, também vai querer comer um fígado e empurrar alguém pra fora do ninho. E você vai começar a ver que, mais cedo ou mais tarde, você vai ter que ter um ninho só seu. Não será mais necessário se arriscar tanto porque agora você aprendeu a voar, teve tempo suficiente. E vai ver que, de repente, aquele amigo lá de trás compartilha o ninho com você e que, quem sabe numa noite chuvosa, talvez numa tarde de verão, num momento de bobeira, vocês resolvem reviver toda essa história de ninho como espectadores e não mais como atores. E que um dia, quem sabe, você, mesmo depois de tanta coisa, vai precisar pular fora do ninho de novo, mesmo com toda aquela altura e todos aqueles crocodilos te esperando lá embaixo...
O tempo passa mais um pouquinho e, atendendo a uma demanda mundialmente aceita, temos que ser educados. Temos que viver de acordo com certas normas impostas por alguém que veio antes de nós. Temos que saber matemática, história nossa e dos outros, ciências e um catatal de coisas que, segundo papai e mamãe, vai nos fazer "alguém" na vida. E aí nos jogam em um local chamado escola para que lá possamos, no espaço de alguns anos, aprender tudo que a humanidade levou toda a sua existência para construir. É aí que pulamos do ninho de novo. Pulamos, sim, porque no ninho é bom que sempre tem comida quentinha, um local aconchegante para dormir e o conforto da asa de mainha pra nos acalentar. E na escola num tem nada disso. Ninguém - ou quase ninguém - tentar comer nosso fígado quando estamos no ninho. Mas aí você, por vezes, ter que sair do ninho. Se não, empurram-te. E se você não souber como sair do ninho, vai se esborrachar lá embaixo. Ou, caso não se espatife por completo, ainda corre o risco de ser devorado pelos seres que vivem fora do ninho.
E é por isso que nós, seres humanos, temos sorte. E temos que agradecer por ela todos os dias. Algumas espécies de águia fazem ninhos tão alto nas montanhas que se os filhotes não aprenderem a voar no espaço de uma primavera com certeza se esborracharão bonito lá embaixo. Pior ainda são as garças: seus ninhos são contruídos em galhos que passam por sobre o leito de rios infestados de crocodilos famintos. Se o filhote pular do ninho e não souber fazê-lo, e se ele não morrer da queda ou afogado, talvez seja devorado por um crocodilozinho de seis ou sete metros. Isso, sim, é crueldade, não?! Malditas garças.
Mas voltando lá pra escola, vemos que o mundo é cheio de quedas altas e crocodilos famintos. Chegamos no colégio sem conhecer ninguém e morremos de chorar quando mamãe e sua asa acalentadora vão embora. É... estamos realmente fora do danado do ninho. Mas aí vamos crescendo. Chegamos a conhecer várias pessoas alí na mesma situação que nós e começa uma ajuda mútua. Porque elas estão fora dos ninhos delas e nós, do nosso. Aí esses a gente chama logo de amigo. E o tempo vai passando. Concluímos "escola" e passamos para o próximo nível: "faculdade". Essa é outra pulada do ninho que merece destaque. Começamos a ver que aquele negócio de ir pra escola pra ser alguém na vida tinha algum fundamento, muito embora já no primeiro dia de faculdade nos mandem esquecer tudo que a gente aprendeu no colégio. E mais quatro ou cinco anos se passam para a gente concluir o estágio "faculdade". Aqui num precisa nem se preocupar em pular; caso você não o faça, eles te empurram pra fora do ninho sem piedade, tal qual as garças.
E depois da faculdade vem um outro estágio, bem mais duradouro e interessante, chamado "o resto da sua vida". Aqui vão querer comer seu fígado, pisar em você, fazer você de presa, ludibriá-lo, enganá-lo, imbecilizá-lo, aliená-lo, emburrecê-lo e por aí afora vai. Você, por vezes, também vai querer comer um fígado e empurrar alguém pra fora do ninho. E você vai começar a ver que, mais cedo ou mais tarde, você vai ter que ter um ninho só seu. Não será mais necessário se arriscar tanto porque agora você aprendeu a voar, teve tempo suficiente. E vai ver que, de repente, aquele amigo lá de trás compartilha o ninho com você e que, quem sabe numa noite chuvosa, talvez numa tarde de verão, num momento de bobeira, vocês resolvem reviver toda essa história de ninho como espectadores e não mais como atores. E que um dia, quem sabe, você, mesmo depois de tanta coisa, vai precisar pular fora do ninho de novo, mesmo com toda aquela altura e todos aqueles crocodilos te esperando lá embaixo...