O mundo urge! Foi assim que minha professora de endocrinologia, conhecedora da medicina como poucos, referiu-se aos tempos atuais após um breve flashback relembrando seus tempos de estudante. Estupefazia-se ela com a velocidade com a qual as coisas aconteciam nos tempos "dela" e como tudo ocorre nos tempos "da gente". O mundo andava muito apressado, aos atropelos, onde os valores de outrora não eram mais os valores de agora. As coisas aconteciam muito precocemente: um dia se vai à escola pela primeira vez; no outro, você está defendendo sua tese de doutorado. E assim vai, com as coisas passando borradas como paisagem na janela do ônibus em viagem.
Por causa disso, somos cada vez mais pressionados por um mundo sem paciência. Tornamo-nos sem paciência. Aceleramos nossa vida para poder acompanhar o ritmo de prova de cem metros rasos que as coisas impõem. Sobra menos tempo pra pensar no que fazer e, com isso, chegamos aos quarenta anos com rugas de sessenta, cabelos de setenta e coração de oitenta. Tomamos escolhas motivados não pelo nosso arbítrio, mas pela influência determinista de mundo ao nosso redor. Pensamos ter total domínio sobre que fazemos e, vivendo essa ilusão, acabamos servindo às necessidades de todos menos às nossas próprias. Somos escravos, minha gente. E do pior tipo de escravidão: aquela que nos faz pensar que somos livres.
Temos, portanto, pressa para nascer. Depois em crescer, estudar, ser alguém na vida. "Alguém", como se nascêssemos com o carimbo de "ninguém" na testa. Freqüentamos a escola não mais para sermos pessoas cultas e íntegras na idade adulta, mas para acumular conhecimentos metódicos e algorítmos para poder fazer algum exame chinfrim e poder ter acesso a uma faculdade. E esperam que tudo ocorra de forma natural, com todo mundo tendo que escolher o "alguém" que vai ser na vida justamente no auge da adolescência. Belo momento pra se fazer uma escolha como essa, ainda mais quando se corre o risco enorme - e bastante provável - dessa escolha ser exatamente a escolha errada. Pensar que se sabe o que quer sempre faz parte da ilusão de que você manda na sua vida, escravo. Saímos da faculdade, trabalhamos, formamos família e chegamos na velhice sem nem pensar se era pra ser assim mesmo.
Com isso, eu volto para o momento da aula, mais precisamente para o momento que mais me surpreendeu: quando todo mundo começou a dizer em alto e bom som que sabia exatamente o que queria da vida, ignorando desde já tudo que ainda faltava para se passar até lá - e olhe que é muita coisa. Aí nessas horas eu penso ser um algo de outro planeta, pois foi nessa hora, nessa mesmíssima hora, que eu me dei conta de que era o único que não sabia. E não sabia com a mesma certeza com a qual os outros sabiam. Mas será que eu tenho necessariamente que saber? Será que essa é mesmo a hora de tomar essa decisão? Até quando o não saber é tido como normal? E vos digo: não sei. Mas não creio que seja um crime não saber que escolha tomar na hora que o mundo assim requer. Muito pelo contrário. O normal é nascer não sabendo.
A aula já acabou. O dia também já acabou. Mas o conflito permanece dentro da cabeça. E nessas horas é compreensível a angústia de quem se sente obrigado a tomar decisões firmes sempre, daquelas que mudam o rumo de tudo. Nossas escolhas, na verdade, são tomadas a cada dia que passa. Cada dia nos é dada a possibilidade de mudar ou continuar exatamente do mesmo jeito, e essa é uma decisão que nós tomamos quase que inconscientemente. Não há porque, pois, sentir-se culpado por não saber, aos dezoito, o que fazer da vida. Muito cinqüentão por aí acha que viveu sabendo, mas no fundo daria tudo pra voltar atrás. Não saber, às vezes, é a coisa mais sabia a se fazer. Não é porque encontramos uma bifurcação no meio do caminho que temos necessariamente que escolher por onde ir. Há ainda a possibilidade de parar. E de permanecer parado por um bom tempo.
Post Scriptum: Continuo sem saber.
Por causa disso, somos cada vez mais pressionados por um mundo sem paciência. Tornamo-nos sem paciência. Aceleramos nossa vida para poder acompanhar o ritmo de prova de cem metros rasos que as coisas impõem. Sobra menos tempo pra pensar no que fazer e, com isso, chegamos aos quarenta anos com rugas de sessenta, cabelos de setenta e coração de oitenta. Tomamos escolhas motivados não pelo nosso arbítrio, mas pela influência determinista de mundo ao nosso redor. Pensamos ter total domínio sobre que fazemos e, vivendo essa ilusão, acabamos servindo às necessidades de todos menos às nossas próprias. Somos escravos, minha gente. E do pior tipo de escravidão: aquela que nos faz pensar que somos livres.
Temos, portanto, pressa para nascer. Depois em crescer, estudar, ser alguém na vida. "Alguém", como se nascêssemos com o carimbo de "ninguém" na testa. Freqüentamos a escola não mais para sermos pessoas cultas e íntegras na idade adulta, mas para acumular conhecimentos metódicos e algorítmos para poder fazer algum exame chinfrim e poder ter acesso a uma faculdade. E esperam que tudo ocorra de forma natural, com todo mundo tendo que escolher o "alguém" que vai ser na vida justamente no auge da adolescência. Belo momento pra se fazer uma escolha como essa, ainda mais quando se corre o risco enorme - e bastante provável - dessa escolha ser exatamente a escolha errada. Pensar que se sabe o que quer sempre faz parte da ilusão de que você manda na sua vida, escravo. Saímos da faculdade, trabalhamos, formamos família e chegamos na velhice sem nem pensar se era pra ser assim mesmo.
Com isso, eu volto para o momento da aula, mais precisamente para o momento que mais me surpreendeu: quando todo mundo começou a dizer em alto e bom som que sabia exatamente o que queria da vida, ignorando desde já tudo que ainda faltava para se passar até lá - e olhe que é muita coisa. Aí nessas horas eu penso ser um algo de outro planeta, pois foi nessa hora, nessa mesmíssima hora, que eu me dei conta de que era o único que não sabia. E não sabia com a mesma certeza com a qual os outros sabiam. Mas será que eu tenho necessariamente que saber? Será que essa é mesmo a hora de tomar essa decisão? Até quando o não saber é tido como normal? E vos digo: não sei. Mas não creio que seja um crime não saber que escolha tomar na hora que o mundo assim requer. Muito pelo contrário. O normal é nascer não sabendo.
A aula já acabou. O dia também já acabou. Mas o conflito permanece dentro da cabeça. E nessas horas é compreensível a angústia de quem se sente obrigado a tomar decisões firmes sempre, daquelas que mudam o rumo de tudo. Nossas escolhas, na verdade, são tomadas a cada dia que passa. Cada dia nos é dada a possibilidade de mudar ou continuar exatamente do mesmo jeito, e essa é uma decisão que nós tomamos quase que inconscientemente. Não há porque, pois, sentir-se culpado por não saber, aos dezoito, o que fazer da vida. Muito cinqüentão por aí acha que viveu sabendo, mas no fundo daria tudo pra voltar atrás. Não saber, às vezes, é a coisa mais sabia a se fazer. Não é porque encontramos uma bifurcação no meio do caminho que temos necessariamente que escolher por onde ir. Há ainda a possibilidade de parar. E de permanecer parado por um bom tempo.
Post Scriptum: Continuo sem saber.